Para nós bioquímicos, o hemograma é uma das ferramentas mais simples e mais importantes dentro de nosso espectro de infinitos e sofisticadíssimos exames laboratoriais.
Um simples hemograma nos dá a “fotografia” do paciente.
Costumo dizer que Hematologia é uma área rica e cheia de pequenos detalhes a serem explorados de forma simples e com magníficos resultados
Trouxemos aqui mais uma evidência dessa magnitude. Um novo parâmetro relacionado ao monócito – Um simples monócito é um grande sinalizador! Segue a explicação resumida e permanecemos á disposição para detalhes e, orientação na observação das lâminas.
Considerando toda a importância e a relevância das funções exercidas pelo monócito na resposta imune inata, é especialmente interessante podermos contar com um parâmetro que indica o grau de ativação dessa células de maneira mais eficaz do que a simples observação morfológica dessas células à microscopia e de uma maneira muito mais rápida e simples do que testes envolvendo tecnologias, embora muito precisas e eficazes, mais sofisticadas e custosas como o uso de marcadores celulares fluorescentes usando citometria de fluxo.
Hoje temos um parâmetro obtido junto ao resultado do hemograma, sem reação ou reagente adicionais e que nos indica a possibilidade de estarmos diante de um caso grave de infecção: o MDW – Monocyte Distribution Width.
O MDW é um índice que avalia a distribuição do volume dos monócitos de acordo com o grau de ativação dessa célula frente a uma infecção. Durante o processo infeccioso, a célula é ativada e sofre alterações morfológicas e funcionais. O aumento e a heterogeneidade do volume da população de monócitos é uma dessa manifestações, o que vai gerar um alargamento na curva de dispersão dos monócitos, semelhante ao que acontece aos glóbulos vermelhos e o RDW, já nosso conhecido como auxiliar no diagnóstico das anemias. E como o RDW é um parâmetro obtido junto com o hemograma, sem nenhuma reação ou reagente adicionais, ou seja, fornece a informação sobre a funcionalidade do monócito rapidamente, em paralelo aos demais resultados do exame hematológico.
Função do monócito dentro do organismo: Os monócitos fazem parte do sistema mononuclear fagocítico constituído de: monoblastos e promonócitos medulares, monócitos de sangue e macrófagos livres e fixados a tecidos.
O monoblasto, quase indistinguível do mieloblasto à microscopia óptica, (digo aqui que quando observamos uma lâmina, muitas vezes conseguimos perceber visualmente a diferenciação da cromatina, algumas vezes, podemos confundir com um linfócito atípico) dará origem ao promonócito que sofrerá duas a três divisões mitóticas em aproximadamente dois a 2,5 dias. Dentro de 12 a 24 horas após seu precursor ter completado sua última divisão mitótica os monócitos são liberados para a circulação, onde ocupam os pools circulantes ou marginal, numa proporção de 1:3,5.
Os monócitos permanecem na circulação de um a três dias, quando migram para os tecidos e órgãos, onde se transformam em macrófagos ou, sob a ação de GM-CSF, M-CSF e IL4 transformam-se em células dendríticas, que estão envolvidas na apresentação de antígenos às células T. A vida média dos macrófagos nos tecidos pode ser de meses a anos.
No hemograma, na análise morfológica do sangue periférico é relativamente comum observarmos monócitos volumosos, com características “atípicas”, alguns com cromatina mais frouxa, núcleo vacuolizado, citoplasma muito azulado contendo vacúolos, alterações ameboides ou difusas muitas vezes com característica que lembram células mais imaturas. Isso acontece devido à grande estimulação que o monócito sofre durante todo o processo de migração e fagocitose, seguido da liberação de citocinas o que vai dar sequência à toda resposta imune diante de um agente infeccioso que é essa sua função. Alguma confusão e complexidade está entre um “monócito atípico” e um “linfócito atípico”. A experiência visual do hematologista consegue diferenciar facilmente essas estruturas com conta das diferentes concentrações da cromatina.
Como se inicia a ativação ou seja, como atua o Monócito frente a agreção:
Em resposta ao processo infeccioso os monócitos migram da medula óssea para o sangue e daí aos tecidos infectados onde mediam a atividade antimicrobiana direta nesses locais. Além disso, monócitos e/ou células derivadas dos monócitos também migram para os linfonodos e promovem a reposta imune adaptativa.
Os monócitos ativados liberam IL-1 e TNF, que por sua vez vão estimular outras células: linfócitos T, células endoteliais e fibroblastos, que liberam fatores de crescimento que atuarão em diferentes linhagens celulares da medula óssea. Algumas das citocinas produzidas vão recrutar células adicionais e proteínas para a área afetada, implementando a resposta imune.
O início da resposta infecciosa se dá quando receptores de membrana dos monócitos (PRRs: Pattern Recognition Receptors) reconhecem receptores da superfície dos microrganismos (PAMPs: Pathogen Associated Molecular Patterns). Em resposta a esse estímulo os monócitos migram da medula óssea para o sangue e daí infiltram os tecidos dentro de um intervalo de 12 a 24 horas. Para percorrer todo esse caminho, os monócitos alcançam a superfície vascular, aderem firmemente ao endotélio para finalmente passarem entre as células endoteliais por diapedese e assim alcançam o local da inflamação. Os monócitos na circulação têm as funções de fagocitose e apresentação de antígenos. Eles removem microrganismos, materiais estranhos ao organismo, células mortas ou lesadas.
Lembrando que as principais funções das células mononucleares fagocíticas estão relacionadas a três principais mecanismos da resposta imune, podemos verificar o seu grau de importância frente aos processos infecciosos, inflamatórios, tumorais e reativos.
– Fagocitose e digestão de microrganismos, material particulado ou restos teciduais
– Interação com antígenos e linfócitos na geração da resposta imune
– Produção de citocinas, mediadores das respostas inflamatória e anti-inflamatória. A função anti-inflamatória exercida pelas citocinas é importante na manutenção da homeostase, na remodelação e cura dos tecidos lesados
– Citotoxicidade, como a eliminação de algumas células tumorais
Finalizando: Por conta dessas especificidades de ação, vemos a importância do HEMOGRAMA e do MDW na prática clínica
Vários estudos têm mostrado a aplicabilidade do MDW nos departamentos de emergência na detecção precoce da sepse e como preditor da gravidade da infecção, o que possibilitou que o MDW tenha sido aprovado pelo FDA como um indicador precoce da sepse. Seu desempenho tem se mostrado semelhante ou superior a outros biomarcadores rotineiramente utilizados na rotina clínica na identificação sepse.
Esse parâmetro é de suma importância na detecção da sepse, um simples hemograma pode te dar essa orientação.
Teste para Hiperatividade monocitária, painél de citoxinas e Hemograma com diferencial bem observada são fundamentias em TODOS os processos inflamatórios, infecciosos, e preventivos. Hoje nos vemos a frente de vários casos de suspeitos de endotelite que, com certeza, podem ser confirmados nesses simples exames.
O completo entendimento do Hemograma é uma ferramenta fundamental, simples e básica que se tem frente a quase toda intervenção médica.
Dra. Célia Wada – CRF-SP – 7043